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Estruturando a cultura e as carreiras de dados na sua organização



Ciência dados. Algoritmos. Análise preditiva. Programação. Deu tela azul no RH.



Desde que a imensidão do universo chamado transformação digital tomou conta das organizações, congressos e eventos, áreas de RH vem tentando surfar nessa onda. Mudança cultural, criação de programas voltados para desenvolvimento de skills digitais e de inovação fazem parte do que deveria ser o caminho para a cultura analítica.

A grande verdade é que esse boom da transformação digital veio sem manual com o passo a passo para a empresa montar.

Participei de muitos congressos e eventos nesses últimos nos quais RHs pomposos foram falar sobre transformação digital e o "People Analytics", a versão de ciência de dados do RH. Slides e mais slides sobre coisas fantásticas que o RH pode (memorize esse palavra, PODE) fazer. Faça um teste: quando acabar uma palestra dessa, vá perguntar ao palestrante se ele(a) pode apresentar algum case real de sua empresa sobre aquele montaréu de palavra bonita proferida durante a palestra.


Muito provavelmente você ouvirá "veja bem, ...". Muito provavelmente, no máximo, o que você verá é um dashboard. Uma pesquisa global realizada pelo International Institute for Analytics demonstrou que grande parte das indústrias e organizações possuem de média a baixa maturidade de dados.


Mas o que significa maturidade de dados ou maturidade analítica?

CULTURA. Significa ter uma cultura na qual os processos de tomada de decisão mais importantes são feitos por meio de dados.


A maturidade analítica é um processo de evolução constante.

O Ricardo Cappra, do Cappra Institute, define a estrutura de maturidade analítica em 5 níveis distintos, em linha ao modelo analítico da Gartner:


  • Nível 1 - Reporting: empresas capazes de criar relatórios pontuais e que utilizam os dados de maneira mais caseira e desestruturada. A pesquisa da International Institute for Analytics demonstra que muitas empresas estão nesse nível;

  • Nível 2 - Analysis: aqui já é possível tomar algumas decisões baseadas em dados e já profissionais na empresa que dedicam seu tempo total ou parcial na organização, mesmo que simples, dos dados;

  • Nível 3 - Monitoring: muitas empresas que chegam no nível de ter dashboards coloridos e funcionais acham que já são o suprassumo do mercado. Daí vão apresentar em congressos e eventos esses mesmos dashboards travestidos de ciência de dados e análise preditiva. Cuidado para não ser essa empresa;

  • Nível 4 - Automation: nesse nível já há procura proativa da organização por novos métodos e ferramentas que potencializam a cultura de dados e, consequentemente o nível de maturidade analítica dessas empresas. Estratégia alinhada com a tomada de decisão baseada em dados e sistemas integrados começam a tomar forma e permitem a automatização de processos analíticos. Aqui já aparece uma claro conhecimento do RH sobre carreiras de dados;

  • Nível 5 - Artificial Intelligence: a empresa passa a usar informação como ativo estratégico e a utilizar a cultura analítica em sua potência máxima como um meio para chegar aos objetivos da organização. Com uma estrutura madura e sólida de dados, os cientistas de dados conseguem trabalhar e entregar valor por meio de algorítmos e análises preditivas.

Só um minuto. E todo aquele papo de People Analytics do RH?


Segundo o Cappra, "cultura analítica não se refere a criar ferramentas, se refere a tomar decisões de negócio baseando-se em dados. A base da Cultura Analítica não pode ser ferramentas, precisa ser pessoas. Ferramentas devem ser utilizadas para resolver problemas bem especificados, enquanto cultura deve correr nos corredores e garantir que as perguntas de negócio estão sendo respondidas com apoio de informações e análises estratégicas, ou seja, data-driven".


Se grande parte das empresas estão no nível 1, 2 ou 3 da cultura analítica, como é possível que o RH esteja tão avançando, segundo todos esses eventos, palestras e congressos que vemos por aí?


Boa pergunta. Faça essa pergunta pro palestrante da próxima vez que ouvir as mil e uma maravilhas do People Analytics. A grande verdade é que se, temos pouquíssimas empresas com cultura analítica madura nos níveis 4 e 5, provavelmente os RHs que entendem de cultura analítica estão nessas empresas. Os demais RHs não tem ideia do que estão falando.

E lembrando que isso não será regra. Muitas vezes, a cultura analítica é uma iniciativa que parte dos negócios e não do RH. Por isso, mesmo em empresas com boa maturidade de dados, você pode encontrar área de recursos humanos que estão, não só longe do negócio, mas longe de entender essa cultura.


Por isso, meu caro(a) leitor, a primeira coisa que o RH deve fazer é procurar conhecimento sobre o assunto de dados, antes de qualquer coisa. Esse é um mundo bastante complexo. Eu também falava muitas dessas palavras bonitas da transformação digital quando estava em RH e só fui descobrir o tamanho desse monstro chamado dados quando fiz minha movimentação para um dos negócios da empresa que já tem uma boa maturidade analítica.


Foi aí que eu percebi que nada sabia sobre o assunto. E hoje, 2 anos depois, posso dizer que sei 5% (e não estou sendo modesto).


Eu descobri isso, quando percebi que na organização, mesmo tendo uma maturidade boa, entre os níveis 3 e 4, estávamos tendo dificuldade para contratar e reter cientistas de dados.


Comecei a analisar, perguntar e entrevistar esses profissionais. Muitos deles tinham vindo de empresas nativas digitais e encontraram um ambiente diferente, mais hierárquico, com uma maturidade analítica mais baixa, o que fazia com que eles fizessem trabalho de organização, estruturação e limpeza de dados. Eu confesso que depois de falar com eles, continuava sem saber bem como tratar o problema. Tive muita experiência em RH com criação de programas de jovens - estágio, trainee e aprendiz e a primeira ideia que tive foi a de criar um programa de estágio em ciência de dados, para que pudéssemos desenvolver pipeline na base para profissionais de dados, além de aumentar a retenção ao oferecer um programa estruturado de aceleramento de carreira para esses jovens profissionais.


E eis que surge, em janeiro de 2020, Elissa Suzuki contratada para ajudar a organização a acelerar a transformação digital e a maturidade de dados. Elissa, desde então, não teve um dia de paz, rs. Em seu primeiro dia, lembro de estarmos tomando café e falando sobre os desafios analíticos que tínhamos. Comentei sobre o programa de estágio que estava pensando em criar e tive, ali, minha primeira chapuletada: "Caio, achei ótima a ideia, mas vamos falar desse negócio de ciência de dados".


Foi ali que percebi que eu não sabia quase nada sobre o assunto. Elissa não só me deu um banho de loja, como também virou uma parceira de ouro no avanço da nossa cultura analítica.


Como a Elissa começou em dados? Como foi a mudança de carreira dessa designer de formação?

Minha atuação com dados se inicia no ano de 2016, quando fui trainee do Banco Santander. Na época, tive a oportunidade de escolher algumas áreas do banco para realizar o job rotation. Como era uma oportunidade única, eu queria me desafiar e sair da caixa, acabei escolhendo áreas completamente diferentes de minha formação e experiências anteriores. Nessa de me desafiar, eu me apaixonei por dados 😊

Eu costumo brincar que todo dia é uma mudança de carreira nesta trajetória, aprendo muito todos os dias e sempre corro atrás. Falando especificamente do momento em que eu decidi trabalhar nesta área, o primeiro de tudo foi admitir que eu não sabia muita coisa e depois, correr atrás: fiz cursos online, os dos primeiros foram de Big Data na Coursera e de python na Udacity e em 2018 iniciei um MBA na área. E sempre pergunte, não tenha medo de perguntar. Elissa Suzuki

Visto essa grande e necessária introdução, vamos falar de carreiras de dados


Por onde começar na estruturação de carreiras de dados?


Segundo a Elissa, sempre entendendo em que momento a empresa está. Ela adiciona:

Não adianta sair contratando cientista de dados à rodo se não existem dados para eles trabalharem e se os gestores não possuem minimamente esta cultura analítica para gerir estes times. Portanto, entender em que momento a empresa está e depois ir construindo quais são as necessidades diante daquele contexto, é um bom primeiro passo 😉


Ela também comenta que é sempre bom envolver negócio, RH e TI nessa estruturação. Negócio trazendo as necessidades que precisa suprir, TI trazendo o olhar técnico e RH o olhar de carreira, pessoas e formação.

Elissa construiu um slide que nos ajudou muito no storytelling da mudança que precisávamos fazer na organização:



Existem muitas possibilidades e possíveis cadeiras em uma carreira de dados. Para simplificar, baseado em um materia da Mckinsey, Elissa divide 3 grandes papéis pelos quais uma organização pode começar, caso já tenha ao menos um nível 3 de cultura analítica:


Data Engineer

O engenheiro de dados é a pessoa responsável pela estruturação dos dados, tornando-os acessíveis. Esse papel é a base da ciência de dados, portanto não adianta sair contratando cientista de dados, como ela bem pontua, se a sua organização está no nível 1 de maturidade e tem dados desorganizados.


O engenheiro é necessário para a criação do pipeline que transforma os dados brutos que estão nos mais variados formatos, desde bancos de dados transacionais até arquivos de texto, em um formato que permita ao Cientista de Dados começar seu trabalho. Cabe também ao Engenheiro de Dados manter este pipeline em execução para que os dados possam ser coletados no momento certo, com o nível se segurança exigido pela empresa. O trabalho do Engenheiro de Dados é tão importante quanto o trabalho do Cientista de Dados, mas eles costumam ter menos visibilidade, uma vez que estão mais distantes do produto final resultado do processo de análise, o que é produzido pelo Cientista de Dados [1].

Essa questão da visibilidade também é um change management a ser feito na organização. O Engenheiro de dados geralmente tem um perfil mais introspectivo, é a famosa pessoa que fica sentada num computador por horas a fio feliz da vida e seu trabalho é um trabalho de backstage. Não será essa pessoa a apresentar um lindo dashboard para a diretoria, mas sem seu trabalho não haverá base sólida para que o restante ocorra.


Data Analyst

Esse papel tem por objetivo trabalhar na base sólida feita pelo Engenheiro de Dados, analisar situações passadas e relatórios para criar visualização de dados por meio de dashboards e relatórios.


Em muitas organizações esse papel se mistura ao de Engenheiro de Dados, mas note que os perfis são diferentes, o que ressalta que as competências também são distintas.

Os Analistas de Dados examinam uma grande quantidade de dados e extraem insights e padrões deles. Eles são responsáveis pela coleta, organização e obtenção de resumos estatísticos. Essas explicações são fornecidas através de visualizações e relatórios, para que as empresas possam tomar decisões estratégicas com eles. Eles precisam de um entendimento básico de programação, matemática, estatística e é preferível que tenham excelentes habilidades de comunicação e considerável conhecimento de ciência da computação. Linguagens R e Python são amplamente usadas em análise de dados e fornecem um arsenal de ferramentas para coleta, limpeza, transformação, processamento e interpretação dos dados. [2]


Data Scientist

O Cientista de Dados é o filet mignon que toda empresa quer agora. Mas percebe a importância do Engenheiro e do Analista antes de ter esse papel?


O Cientista irá olhar para os eventos passados e presentes para realizar analises preditivas, ou seja, trazer cenários futuros possíveis por meio de algoritmos e inteligência artificial.


Um Cientista de Dados possui todas as habilidades de um Analistas de Dados, com profundo conhecimento de modelagem, estatística, matemática e ciência da computação. Com sólidas habilidades em matemática, estatística e mineração de dados, os Cientista de Dados são especialistas em modelagem preditiva e aprendizado de máquina. Portanto, eles podem criar modelos preditivos complexos que podem fornecer recomendações válidas com base em dados históricos.

O fator de diferenciação, no entanto, é a perspicácia comercial robusta que diferencia o Cientista de Dados dos Analistas.

É necessário que um Cientista de Dados possa transmitir as descobertas na forma de uma história para os profissionais de TI e os gerentes de negócios, para que possam correr riscos calculados e tomar decisões viáveis com base nas informações fornecidas pelo Cientista de Dados [2].


O que é mais importante para minha empresa primeiro? O Cientista, Analista ou o Engenheiro de Dados?

Socorre a gente aqui, Elissa: Que pergunta polêmica, rs ! Eu diria que o mais importante é trazer valor ao negócio e ao cliente usando dados. Sempre lembrando que para isso acontecer existem várias carreiras de dados por trás, incluindo cientista e engenheiro de dados. Deve se montar uma equipe adequada dependendo do estágio de maturidade analítica que a empresa se encontra e também do investimento da empresa em dados. Dessa forma, mais próxima do equilíbrio a empresa estará (Ps. Pareceu o mestre Yoda falando, rs).

Não se trata de contratar apenas cientistas ou apenas engenheiros, mas sim encontrar um equilíbrio entre as carreiras dentro do contexto em que se está inserido. Elissa Suzuki

Mas, se for começar, não dá para contratar Cientista de Dados se não houver essa cadeia, por isso, vá pela base primeiro. Foi isso que fizemos, depois de tantas conversas, ao criar o Programa de Estágio de Data & Analytics da Bayer, uma das muitas ações que a nossa organização faz em prol da cultura analítica.


Um Programa de Estágio do negócio e do zero

Voltando ao nosso problema inicial de contratação e retenção de cientistas de dados, mudamos completamente o rumo e objetivo do programa de estágio seria o de criar pipeline para as carreiras de dados, focando em engenharia e análise de dados.


O piloto do programa com 14 estagiários foi lançado em junho de 2020, 5 meses depois das conversas iniciais que eu e Elissa tivemos para a área de Product Supply LATAM da Bayer CropScience.


O programa foi construído em parceria com diversos profissionais de diferentes áreas, incluindo RH e IT. Já vale um agradecimento especial ao Kauê e ao Bruno que fazem parte da robusta governança do programa.


Como foi criar o programa de estágio de Data & Analytics na Bayer?

Elissa responde: não só foi como tem sido incrível! Criar uma trilha técnica em parceria com a Mastertech, adequada à realidade que temos na Bayer CropScience para estagiários de todo o Brasil, ver o crescimento e desenvolvimento deles e os resultados de seus projetos refletidos no negócio, é realmente muito gratificante !


O programa tem duração de 2 anos e conta com uma trilha de dados, fornecida pela Mastertech, de 120h. Fato é que profissionais de dados estudam MUITO e no programa replicamos isso. Os estagiários não trabalham nas nossas short fridays. Eles tem aula das 09h00 às 12h00, dedicando um dia da semana somente para estudo.

Na trilha, eles possuem base de programação, estatística, Scrum (ágil), modelagem e análise de dados. Além disso, cada estagiário possui um projeto estratégico ligado a necessidades de negócio e alguns deles trabalham em formato de squad, utilizando o Scrum.


Os estagiários também contam com mentoria interna feita pelos nossos profissionais de dados, além de mentoria fornecida pela Mastertech.

Tem sido fantástico ver os resultados do programa e o quanto tem contribuído para avançarmos ainda mais na cultura analítica (rumo ao nível 5, um dia 😉).


No final de 2020, os estagiários tiveram a oportunidade de participar da nossa versão de shark tank, no qual eles apresentaram projetos desafiadores aos executivos de Product Supply LATAM em busca de "investimento" da moeda fictícia PS Bitcoin. Os estagiários puderam trocar os valores recebidos por mentorias, planos de change management para seus projetos e treinamentos.


Dicas para empresas que ainda estão iniciando a cultura analítica

Elissa é categórica:

Eu vou deixar algumas dicas aqui, porém a maior dica que eu deixo é sempre se perguntar ‘ que problema eu quero resolver ou que pergunta eu quero responder com dados?’ antes de sair contratando cientistas, comprando ferramentas e soluções.

Ela ainda adiciona que quando falamos em início de uma cultura analítica, antes de tudo precisamos entender o grau de maturidade analítica da empresa, ou seja, em que momento ela se encontra em relação à análise de dados. (neste link tem uma reportagem bem bacana do Cappra falando sobre isso).


Este passo é muito importante porque talvez no início a empresa não precise de um algoritmo que utiliza machine learning para responder perguntas simples que vão ajudar o negócio. Pós feito este diagnóstico, comece pequeno, elenque alguns casos de uso de dados, teste de hipóteses que terão como output produtos analíticos que embasarão na tomada de decisão. Transversalmente a tudo isso, tenha uma equipe adequada, disponível e que seja a dona desse movimento para ir provando valor com esses casos de uso e ir espalhando este movimento para toda a companhia. Arremata Elissa.


Se você está chegando a conclusão de que o caminho na sua empresa também será árduo, comece por:

  1. Educação: obter o conhecimento necessário para realizar uma mudança cultural será muito útil. Leituras, curso (esse do Cappra é ótimo), conversas com a liderança e com os profissionais de dados ajudam. Conhecer os conceitos de cultura analítica e de change management serão fundamentais

  2. Alinhamento da estratégia organizacional à cultura analítica que será criada: Sem o apoio e entendimento da alta liderança, nada disso será possível. Os líderes tem o enorme potencial de parar ou desacelerar essas ações. Um programa estruturado de mudança cultural também será fundamental

  3. Comece a estruturar as carreiras de dados: job descriptions, benchmarking de empresas que já possuem carreira em dados, programas de entrada como programa de estágio, programas de formação interna de profissionais de dados, etc


Seja você de RH ou de negócio, fiz esse artigo longo e agradeço se chegou até aqui, pois quis demonstrar um pouco da própria jornada que eu passei para chegar nos meus 5% de conhecimento de um tema que é bem complexo.


[1] http://datascienceacademy.com.br/blog/o-que-faz-um-engenheiro-de-dados/

[2] http://datascienceacademy.com.br/blog/qual-a-diferenca-entre-analista-de-dados-e-cientista-de-dados/

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Caio Ianicelli Cruzeiro tem mais de 13 anos de experiência em Recursos Humanos. É também palestrante e coordenador de grupos de networking voltados para RH e executivos e atualmente é Gerente de Educação Corporativa em Product Supply LATAM do agronegócio da Bayer. É graduado em Administração, pós-graduado em Educação Corporativa pelo SENAC-SP e cursa MBA em Agronegócios pela Esalq-USP. É Prosci® Certified Change Management Practitioner e Agile Scrum Certified SFC


Autor do livro "Talent Acquisition: a evolução do recrutamento & seleção tradicional" que pode ser adquirido aqui


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